Governo envia ao Congresso Medida Provisória; veja análise de especialistas
Para fechar o Orçamento de 2025, governo aposta em medidas tributárias para aumentar arrecadação, mas enfrenta resistência do setor privado e do Congresso
Publicado: 11/06/2025 às 22:13

Praça dos Três Poderes (Brasília-DF) (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
O governo federal publicou nesta quarta-feira (11) à noite uma nova Medida Provisória (MP) e um Decreto Presidencial com um pacote de mudanças tributárias, visando compensar o recuo da alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) anunciado no mês ado. A medida reforça a estratégia econômica da equipe do ministro Fernando Haddad, que tem enfrentado resistências no Congresso Nacional.
Especialistas alertam para os efeitos colaterais da MP. Em entrevista ao Diario, o professor de Economia e Finanças da UFRPE, Luiz Maia, avalia que a proposta pode ter impacto regressivo sobre o consumo e provocar efeitos indiretos na inflação.
"Mesmo que as propostas mirem as transações realizadas por pessoas de classe média alta ou [classe] alta, a cadeia produtiva tende a rear esse ônus. Qualquer aumento de custo, mesmo que mirado nos ricos, acaba chegando no consumidor final", afirmou.
Segundo Maia, a tributação sobre LCIs e LCAs deve encarecer o crédito para os setores da construção civil e do agronegócio, dois pilares da economia nacional. "Se o produtor do campo paga mais caro para captar recursos, ele rea para a indústria, que rea para o consumidor. É efeito em cascata", explica.
Outro risco apontado pelo economista é a fuga de capitais, especialmente em relação aos fundos de investimento e às plataformas de apostas. "Investidores podem migrar para países com menor carga tributária, e as bets ilegais tendem a crescer diante da elevação das alíquotas das legais. A regulamentação precisa vir com fiscalização forte", pontua.
O cientista político e professor de direito constitucional na UniFafire, Felipe Ferreira Lima, explica que em um ano não eleitoral como 2025, o ambiente político costuma ser mais favorável para medidas impopulares. Isso porque as pessoas tendem a "esquecer" essas políticas.
Ainda assim, o governo enfrenta dificuldades para articular sua agenda econômica no Congresso. As resistências vêm, sobretudo, de bancadas ligadas a setores diretamente afetados pelas propostas — como o agronegócio e o mercado imobiliário, alvos de mudanças na tributação.
Maia destaca ainda que a ausência de um plano concreto de revisão de gastos mina a credibilidade do pacote, e completa que o problema estrutural é o crescimento dos gastos públicos sem contrapartida de qualidade. Para ele, o Estado precisa buscar meios de entregar os mesmos serviços gastando menos.
Como exemplo, ele cita o uso de tecnologia em serviços como segurança pública. "Em vez de contratar mais policiais, por que não investir em câmeras e inteligência artificial? É possível entregar o mesmo com menos custo", argumenta.
O economista também criticou o esvaziamento da agenda de revisão de despesas, inicialmente sob responsabilidade da ministra do Planejamento, Simone Tebet.
""Esperava-se um mapeamento criterioso dos gastos — onde cortar, onde melhorar a eficiência — e isso não veio"". Luiz Maia, economista
Consequências fiscais
Caso o pacote não avance no Congresso, o economista alerta para um cenário de deterioração fiscal, e destaca que a cada mês que a o governo se afasta mais da meta, afetando a confiança dos investidores e o clima de risco no país, o que pressiona o dólar e pode gerar inflação e desemprego.
Para ele, a única saída real é reorganizar o Estado e encarar de frente a estrutura do gasto público, já que medidas pontuais ou antecipações de receitas, como dividendos da Petrobras, já adotadas em outras gestões, têm consequências graves e são apenas paliativos.
O Palácio do Planalto aposta em articulação com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para garantir a tramitação das propostas ainda no segundo semestre. O embate entre Executivo e Congresso será determinante para os rumos fiscais do país em 2025.
Saiba mais sobre o que está acontecendo
A movimentação do governo busca alcançar a meta de déficit fiscal zero em 2025, e ocorre após reuniões com líderes partidários no fim de semana, em meio a uma conjuntura de dificuldades na execução do ajuste fiscal.
O novo pacote de medidas fiscais havia sido apresentado pelo Ministério da Fazenda no último domingo (8), quando foi duramente criticada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), que afirmou que ela "não será bem aceita pelo setor produtivo nem pelo Legislativo".
Entre as proposições, estão a tributação inédita de 5% sobre as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA), até então isentas, e a unificação da alíquota do Imposto de Renda sobre investimentos em 17,5% — o que reduz a carga sobre aplicações de curto prazo, mas encarece investimentos mantidos por mais de dois anos.
Também foi ampliada de 12% para 18% a tributação sobre apostas esportivas eletrônicas ("bets"), incluída a taxação de criptoativos e a padronização da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para as fintechs (instituições financeiras).
O conjunto de medidas tem como meta reduzir em pelo menos 10% os chamados gastos tributários e reforçar a arrecadação em cerca de R$ 30 bilhões por ano.

